sexta-feira, 15 de abril de 2011

Você diz não?




Todos o viam como um rapaz solícito e dedicado, mas ele simplesmente não gostava de dizer não. Essa palavrinha o fazia temer. Temer o que mesmo? Ele não sabia ao certo: ser considerado chato, desagradar às pessoas, talvez. Intimamente, porém, o que ele mais temia era o poder da palavra não de machucar a si próprio. Por isso sorriu amarelo e disse sim quando vieram às pressas chamá-lo para substituir alguém na peça de Natal que seria apresentada na igreja. Você pode ir? Só vai ter que se vestir de anjo e ficar lá na frente. Tudo bem, ele diria sim mesmo que tivesse que recitar o salmo 119 de cor.

E no dia, lá estava ele com umas asinhas de isopor muito esquisitas insistindo em lhe cair nos ombros, e o que é pior: uma bata mínima que deixava à mostra suas pernas por inteiro, porque não houve tempo de arranjar uma que fosse do seu tamanho. Enquanto esperava a programação acabar, ele, de cabeça baixa, ouvia risos abafados, puxava a bata para baixo e prometia a si mesmo nunca mais aceitar nada que lhe propusessem. Muita gente ficaria magoada, mas o que fazer? Um sim inconseqüente pode doer infinitamente mais que um não. Pensava ele, mexendo nervosamente os ombros tentando equilibrar as asas de isopor, até que uma delas partiu-se e caiu solenemente no chão.

E sua história tragicômica (que me salvou de contar uma das minhas) me fez lembrar a parábola dos dois filhos, que está em Mateus 21: 28-32. Jesus estava ensinando no Templo quando alguns sacerdotes e religiosos de altos cargos achegaram-se para questionar com que autoridade ele ousava desafiar o sistema religioso de então com idéias, palavras e atitudes que mudavam completamente a noção de Deus que vigorava naquela época. Jesus não respondeu de pronto a pergunta deles, mas contou antes uma parábola, que o livraria de uma vazia discussão teológica e ensinaria aos mais humildes que o escutavam uma lição superior sobre o amor - sempre a ênfase da pregação de Cristo.

A parábola conta que um pai chamou seus dois filhos para trabalharem na vinha. Aqui, Cristo nos remete ao capítulo cinco de Isaías. Quem sabe não era sobre o profeta que Jesus falava ao ser interrompido pelos sacerdotes? A vinha representa o próprio povo de Deus, separado, escolhido e cuidado para dar bons frutos, mas que acabou por se afastar bruscamente dos propósitos divinos, até tornar-se deserto. Pois bem, um dos filhos disse sim ao pai, no entanto não foi trabalhar. O outro filho disse que não queria ir. A Bíblia não diz que o Pai questionou os motivos do filho - um dia de sol que convidava a tomar banho no rio Jordão, um compromisso com os amigos, uma aula de técnica vocal; diz somente que ele não queria ir à vinha, foi sincero e disse não. Até aí os dois filhos estavam em pé de igualdade, nenhum deles havia feito a vontade de seu pai. Mas aquele que disse não se arrependeu em seguida e foi trabalhar conforme seu pai havia pedido.

Numa pequena história, duas mensagens igualmente importantes. A primeira é que um não é insuficiente para afastar um filho da vontade de seu Pai. A maravilhosa graça de Deus espera que compreendamos a sua vontade e aguarda o nosso arrependimento sincero. Deus ama a sinceridade de coração. Não força, não questiona, não briga. Ele apenas pede e espera. Não quer um sim medroso, cheio de dúvidas ou contradições. Quanto mais O conhecemos, mais Seu amor nos impele a servi-lO com alegria, e é essa a resposta que Ele deseja de nós. Mas de vez em quando nossa natureza humana, maculada de egoísmo, vai negar-Lhe uma entrega. E Ele vai estar lá, esperando que o amor que nós conhecemos nEle nos leve a arrepender e voltar atrás.

Depois, a segunda mensagem: um sim hipócrita sempre afasta o filho da vontade do Pai. A Bíblia não diz qual motivo fez o filho voltar atrás no seu sim. Pode até ter sido um motivo que os sacerdotes do templo diriam:nobre ou aceitável. Jesus queria dizer a esses homens é que o povo de Deus não é aquele que uma vez disse sim à religião para vivê-la de forma nominal e hipócrita; povo de Deus é todo aquele que faz a Sua vontade, e renova o seu sim continuamente perante Deus, e não perante ritos e formas vazios. A religião que, de fato, nos liga ao céu é aquela onde se entrevê o Caminho, a Verdade e a Vida, onde o amor não fica estagnado na palavra, mas se manifesta com a pureza do Verbo. Jesus afirmou que a crença aceitável é estar aberto para os caminhos da Justiça Divina, e não da justiça própria. Pois, tantas quantas forem as promessas de Deus, nele está o sim; portanto é por ele o amém, para glória de Deus por nosso intermédio (II Coríntios 1:20)

Eu gostaria que ouvíssemos o que o Pai nos pede, e disséssemos sim. Ele sabe dos possíveis motivos que temos para lhe dar um não sincero, mas não há sentido em confiar em atalhos entre nós e Ele quando temos tão pouco domínio sobre nosso futuro: quem garante que o tempo nos permitirá retificar nossas respostas? Mas se for para dizer sim, que o façamos em sinceridade de coração, dispostos a levar adiante a fé que professamos, fazer eterno o breve instante afirmativo corroborando-o em cada detalhe da nossa religião. Lembre que um não pode vir a te entristecer, e que um sim falso pode entristecer o Ser que mais te ama no universo.

Autoria desconhecida

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Um comentário:

Carolina disse...

Linda mensagem para começar o dia!